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quarta-feira, 4 de abril de 2012

o percurso da linha na história da arte

patrícia ferreira - lápis de cor, acrílico e ponta porosa sobre canson

A linha é definida como uma marca com comprimento e direção, criada por um ponto que se move através de uma superfície, podendo variar em comprimento, espessura, direção e curvatura.

A linha circunscreve e delineia a forma, mas não é forma e, em geral, não é considerada como contendo uma cor. Para alguns pensadores, ainda hoje, a linha não pode subordinar a cor e, por essa razão, não pode ser considerada como pintura. Ela é associada a conceitos como razão, lógica, controle, precisão, bidimensionalidade e refinamento. A cor, por sua vez, é associada às ideias de sentimento, mobilidade, densidade, tridimensionalidade, opticalidade e qualidades tácteis. Nesses termos, a cor seria o veículo ideal e fundamental para a pintura.

A dificuldade em conceber a linha como cor (pintura) provém de uma antiga dicotomia, entre o linear e o pictórico, estabelecida formalmente em 1915, por Woelfflin, em Principles of Art History. No entanto, desde o final do Século XV essa discussão já se processava.

Ticiano e Botticelli são fortes representantes dessa polaridade. A pintura de Ticiano deve muito à escultura que, inicialmente, ensinou aos artistas como modelar e sombrear para dar uma ilusão de relevo, e, também, os ensinou como compor essa ilusão numa ilusão complementar de espaço em profundidade (perspectiva). A pintura no ocidente, durante muitos séculos, lutou para ser uma pintura escultural, para salvar-se da bidimensionalidade, sempre relacionada ao uso da linha.

Nas obras de Ticiano, vemos o que está em seu quadro antes mesmo de vermos o quadro como pintura. Para os defensores da pintura pictórica escultural, os limites lineares das obras de Botticelli são uma espécie de fuga do realismo. Em Botticelli, temos a noção da bidimensionalidade da pintura antes, e não depois de nos tornarmos conscientes do que essa bidimensionalidade contém. Ao chamar atenção para a própria pintura e não para o que está contido nela, a obra de Botticelli ganha uma dimensão auto-referencial que se tornaria, muito tempo depois, uma das principais características da pintura moderna.

No século XIX, Jean-August-Dominique Ingres, apesar de ser filho de um escultor ornamentista, opôs-se radicalmente ao triunfo da pintura pictórica, representada, na época, por Delacroix. Ingres realizou pinturas que se colocavam entre as mais bidimensionais e menos esculturais já feitas no Ocidente por um artista sofisticado, desde o século XV. Desse modo, a partir de meados do século XIX, todas as tendências ambiciosas da pintura convergiam numa direção antiescultural, plana e linear. Ao chamar a atenção para sua própria bidimensionalidade, para o fato de ser uma superfície plana, a pintura se tornou mais consciente de si mesma.

Matisse foi o primeiro artista a liberar a linha para operar com a cor tanto quanto com o puro desenho. As linhas em seu quadro La Joie de Vivre, por exemplo, estruturam toda a composição, independentemente das figuras que se definem. As cores, nesta obra, são planas e completamente subordinadas às linhas.

A tridimensionalidade é domínio da escultura e, para garantir sua própria autonomia, a pintura vem tentando despojar-se de tudo que poderia ter em comum com a escultura. Desse modo, a linha se tornou um importante elemento expressivo para a pintura moderna. E é nesse curso que a pintura moderna se tornou autoreferencial e autocrítica.

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