“A única finalidade aceitável das atividades humanas é a
produção de uma subjetividade que enriqueça de forma contínua sua relação com o
mundo.” (Guattari)
Eu
sempre me considerei uma artista, mesmo antes de saber o que significava ser
artista. Sentia um grande impulso para exercitar minha subjetividade, mas
acabava me confundindo, reduzindo o valor desse exercício de subjetividade
diante da demanda para produzir objetos acabados. Mas a busca pela “beleza”,
pelo ornamento, pelo resultado aceitável para o consumo, me causava grande
insatisfação. Era como se um poder arrebatador fosse domado pelo ornamento. Lembro-me
o quanto me senti satisfeita quando li, num pequeno livro do Gullar, que o
Cézanne dizia que “o acabado é o prazer dos imbecis”. A rejeição de Cézanne ao
acabado implica na concepção da obra de arte como uma experiência
permanentemente aberta, uma incessante busca e uma incessante descoberta. Trata-se
da rejeição de normas e soluções preestabelecidas, com o objetivo de manter o
frescor e a surpresa da criação artística. É isso que separa o artista do
artesão.
Depois
de conhecer o Eduardo Kac, durante um curso de holografia que ele deu aqui em
Goiânia, em 1988, essa busca pela experiência e pela invenção só ficou mais
intensa. Naquele tempo, o Eduardo Kac já falava de Internet, que, na época, era
a Minitel, falava de arte digital, telepresença, bioarte, criação de avatares
para fazer arte interativa em rede etc. Isso tudo parecia muito louco e muito
excitante. Essas ideias ficaram martelando na minha cabeça de um tanto que
acabei fazendo um doutorado, na área de estudos literários, na linha de
pesquisa poéticas da modernidade, misturando visualidade, arte e tecnologia. O
título da minha tese é “O Ver Poético:
Arnaldo Antunes e Eduardo Kac”. Meu interesse, na tese, era de entender a obra
de dois poetas/artistas que lançavam mão de procedimentos computacionais em
seus processos criativos. Mas o trabalho não ficou apenas na teoria, para
fazê-lo, acabei desenvolvendo um projeto prático, o Di(per)versões Eletrônicas,
para entender o que acontecia com a arte e com o artista utilizando esse novo
meio que é o computador.
Essa
experiência com o meio digital mexeu comigo. A estética digital combina com a
minha visão da ética do artista. Para mim, o artista não deve se resumir à
fabricação de artefatos belos, o artista deve produzir relações com o mundo
através de objetos, signos, gestos, formas, tudo ordenado segundo uma visão do
mundo e da arte. Eu adoro uma frase do Felix Guattari que diz o seguinte: “a
única finalidade aceitável das atividades humanas é a produção de uma
subjetividade que enriqueça de forma contínua sua relação com o mundo”. É isso
que eu procuro fazer com minha arte e, de quebra, acabo trabalhando para uma
re-significação do real. Mas você pode me perguntar, “como assim?”. De forma a
não duplicar os modelos doentios que existem no mundo atual, um dos piores
deles sendo as relações do mercado econômico. Quero que todos possam fruir o
meu trabalho, tudo que faço está na web. Se alguém gosta de um trabalho meu e
quiser colocá-lo na parede, eu dou o trabalho de graça. Na verdade, eu tenho
chamado meu trabalho de “gesto de artista”. O gesto pode se fixar numa moldura
em alguma parede, mas, a partir de sua digitalização, ele fica pra sempre
compartilhado com todos, na sua “aura digitalizada” em bits. Tem um artista
italiano, o Piero Manzoni que, em 1961, numa atitude contrária ao mercado e à
arte tradicional, inventou o “fôlego de artista”, a obra era literalmente o seu
sopro num balão inflado. Imagina o que o Manzoni teria feito se tivesse uma
internet?
Eu criei o blog patworkpat http://patworkpat.blogspot.com/, onde publico meus gestos de artista, como eu denomino
minhas pinturas. O
bom do patworkpat é que ele não deixa os meus gestos enquadrados na parede, podem até
ficar, mas suas almas de bits estão voando por aí e criando outra economia para
a minha arte. A imagem digitalizada continua minha, mas também é de todos que queiram compartilhar esse gesto.
Adorei o texto e até fiz um second life também.
ResponderExcluirQue legal! Adoro explorar essas ferramentas maravilhosas que a internet nos oferece!
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